quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Farra do boi no litoral de Santa Catarina


              Antigamente em Florianópolis a alimentação se dava basicamente de peixe, linguiça e carne de caça; a carne bovina era um artigo de luxo, servido só nas principais festas cristãs, como a Páscoa e o Natal. Durante a Semana Santa era comum que os ilhéus comprassem gado dos tropeiros do interior do estado e os deixassem em pastos até o abatimento no sábado, véspera do domingo de Páscoa.  Algumas pessoas neste meio tempo iam atiçar os bois no pasto, que perturbados, fugiam.
                Além disso, outras culturas influenciaram a existência da Farra do Boi no litoral catarinense: as touradas dos espanhóis e açorianos. O ritual do “boi do campo” passou a ser realizado em algumas cidades do nosso estado e é muito semelhante às touradas à corda dos Açores: um boi bravo era solto pelas ruas e perseguido pelos moradores. Essa cultura persistiu por décadas, apesar de muitos bois em sua fuga entrarem em propriedades privadas e estragarem patrimônio público. Por volta da década de 80, quando muitas pessoas de outros estados começaram a morar em Santa Catarina e principalmente em Florianópolis, a perseguição aos seguidores desse “ritual” começou.
                Boi do campo passou a ser conhecido como Farra do Boi e as pessoas que participavam dele eram chamadas de “farristas”. Até hoje esse costume é mal visto por muitas pessoas e ONGs de proteção animal. Graças a uma lei federal que condena os maus tratos a animais, desde 1998 a farra é considerada crime. Muitos adeptos, numa tentativa de justificar seus atos, buscam na preservação da tradição seus motivos. Alguns inclusive dizem que a farra é a encenação da Paixão de Cristo, onde malha-se o boi como se este fosse Judas. Outros dizem que o boi simboliza Satanás e que machucando-o estamos nos livrando dos pecados.

                Seja qual for a justificativa dada pelos adeptos, a verdade é que não se sabe quanto da cultura original se preservou neste processo todo. Algumas localidades tentaram regulamentar a “brincadeira”, criando formas de controlar os participantes. Em 2007 o município de Governador Celso Ramos legalizou a “Brincadeira do Boi”, onde instituía penalidade em caso de excessos e de danos ao animal e a terceiros.
                 Mas não se pode ter controle de todos os participantes. Mesmo que a intenção de quem organiza este costume não seja de maltratar o boi, há relatos em que o animal é confinado durante dias sem alimento, depois é solto pelos farristas e perseguido e machucado por pedaços de madeira, pedras, cordas, chicotes e até mesmo facas. Inclusive a orientação nesses casos é para que não matem o animal, para que a “brincadeira” dure por mais tempo.
                Infelizmente, mesmo sendo crime há mais de cinco anos, até hoje é comum encontrar farra do boi na época da semana santa, em várias cidades, principalmente da Grande Florianópolis.


A título de curiosidade, segue a lei:
Capítulo V – Dos Crimes Contra o Meio Ambiente
Seção I – Dos Crimes Contra a Fauna
Art. 32: Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos.
Pena: Detenção, de três meses a um ano, e multa.
               

Fontes:

SOUZA, João Carlos Silveira de. Roteiro das manifestações culturais do município de Florianópolis. Fundação Franklin Cascaes. Florianópolis, 2008.

Farra do Boi - www.farradoboi.info
Guia Floripa - www.guiafloripa.com.br
Instituto ‘É o bicho’ - www.eobicho.org
Nova Ordem Política - novaordempolitica.wordpress.com
Núcleo de Estudos Arte, Cultura e Sociedade na América Latina e Caribe - www.musa.ufsc.br
Portal das Festas do Divino Espírito Santo - www.portaldodivino.com
Projeto Esperança Animal - www.pea.org.br
Rádio e Televisão de Portugal - ww1.rtp.pt


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